terça-feira, 9 de dezembro de 2014

O TRAÇADO

Amanheço outra a cada dia,
vestida de ontem e repleta de amanhã.
Estranho um pouco o silêncio e o escuro,
essa ausência anunciada que me beija os pés
e convida as mãos a traçar uma órbita distinta
capaz de sobrevoar as lembranças
e decompor os mistérios
que se fizeram sonhos no meio da noite.
Lembro-me de que tenho raízes, folhas e frutos
... e flores para acomodar nas reentrâncias da alma.
Daqui a pouco será NATAL:
ja vejo luzes nascendo repetidas,
prontas para o voo digital e suas minúcias.
Nessa hora, eu quero ainda os vaga-lumes
e a inocência dos dias
que se repetiam sem os cataclismos de agora.

Basilina Pereira

domingo, 30 de novembro de 2014

O AMOR

Amor é desassossego
planta rara em floração,
traça caminhos de estrelas
faz descalço o coração.

Nada é mais forte e seguro
e ao mesmo tempo um cristal,
tece o corpo, veste a alma,
entre a brisa e o vendaval.

Fabrica ninhos de sonhos
colhe a lua por prazer,
faz trilha rente ao abismo
voa o medo de sofrer.

E ao final colore a vida
cada dia é um jardim,
toda hora um brilho novo,
que move as velas do sim.

Basilina Pereira

terça-feira, 11 de novembro de 2014


DESCUIDO 

Procuro uma embalagem para a minha alma.

Se eu a encontrar hoje,

pode ser do tamanho pequeno

porque ela está bem minguada.

Normalmente esbanja robustez e saúde,

acredita nas vozes de perto e de longe,

nos sorrisos que brotam em meio à neblina

e até nas coisas que não fazem sentido.

Como é bom acreditar!

Pensar que o sol vai retornar amanhã

e a porta do coração deve estar sempre aberta

para os pássaros que procuram abrigo.

Talvez eu tenha subestimado o vento que açoita por dentro

e imaginado que ali fosse um compartimento seguro

onde a dor física não conseguisse chegar.

Por isso deixei as chaves brincando na chuva,

não troquei o segredo das distâncias

mais um descuido...um lapso

de uma vida alagada por grandes perguntas

 Basilina Pereira

segunda-feira, 18 de agosto de 2014


DESCUIDO 

Procuro uma embalagem para a minha alma.

Se eu a encontrar hoje,

pode ser do tamanho pequeno

porque ela está bem minguada.

Normalmente esbanja robustez e saúde,

acredita nas vozes de perto e de longe,

nos sorrisos que brotam em meio à neblina

e até nas coisas que não fazem sentido.

Como é bom acreditar!

Pensar que o sol vai retornar amanhã

e a porta do coração deve estar sempre aberta

para os pássaros que procuram abrigo.

Talvez eu tenha subestimado o vento que açoita por dentro

e imaginado que ali fosse um compartimento seguro

onde a dor física não conseguisse chegar.

Por isso deixei as chaves brincando na chuva,

não troquei o segredo das distâncias

mais um descuido...um lapso

de uma vida alagada por grandes perguntas. 

Basilina Pereira

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domingo, 27 de julho de 2014

MUROS DE CINZA


MUROS DE CINZA 

Eram altos, pontiagudos,

prontos a devorar meus sonhos.

Eram densos, grises,

moldados pela incerteza.

E eu ali: na inocência das horas,

sendo bebida gota a gota pelo dia que não amanhece.

Ventos vorazes, como lâminas,

a rasgar-me a carne

e risos gaiatos a sinalizar o declínio da chama.

Presa apenas a um fio de esperança, pergunto:

onde ficaram meus pés?

 

Basilina Pereira

sexta-feira, 18 de julho de 2014

SEM PRESSA


SEM PRESSA
 

Em tardes maduras

o quase silêncio é desembrulhado

pelas sombras do tempo

que, por vezes, pesam

na paredes da memória.

Lembranças rasgam a solidez do pensamento

e irrompem.

Algumas consomem-se na palidez das horas,

outras reverberam em gestos minúsculos,

desgarrados de algum compartimento sem tranca

como se quisessem derramar soluços inacabados.

Sem nenhuma razão segura,

já não há mais pressa no olhar,

o desconhecido é só mais um ponto cego

que já não se esconde do medo nem da solidão.
 

Basilina Pereira

domingo, 13 de julho de 2014

POEMETO DO ENTARDECER


POEMETO DO ENTARDECER
 

Cheiro de chuva no vento,

sopro de versos nas folhas,

sol em dourado e cinzento,

lua espraiando nas bolhas

desse nosso sentimento

incrustado nas escolhas:

imagens de um só momento

na retina de quem olha

e consegue ver, isento,

que o entardecer também chora.
 

Basilina Pereira

 

sexta-feira, 11 de julho de 2014

REFLEXOS


REFLEXOS
 

Uma gaivota bate asas

no fundo do teu olhar

seu voo é toque de brasa

chama que esvai, devagar.

 

Há um reflexo que me ofusca

quando olho pra este céu

não sei se a rima me busca

ou se o verso segue ao léu.

 

E entre nuvens que passeiam

por caminhos de água e luz,

teus olhos, é certo, semeiam

o brilho que me seduz.
 

Basilina Pereira

quinta-feira, 10 de julho de 2014

DELÍRIOS


DELÍRIOS
 

Quisera meu coração de madrepérola

(pela filha, não por ela)

e também por sua cor – aquele brilho boreal.

Meus cabelos nasceriam de um girassol

e cresceriam em pleno meio dia;

meus pés viriam de Pégaso:

tão fluidos que seguiriam o vento

e depois se agarrariam ao solo,

no frêmito da semente.

Nos olhos, eu queria um ninho de condor

e imaginaria asas em cada sopro

 que brotasse do pensamento.

Sei que há febre em meus delírios.

Às vezes invento prelúdios tão outros

que chegam a atormentar minha lucidez,

mas vem a noite e a lua me acolhe

e em seu lume eu posso ser

tudo aquilo que fugiu de mim.
 
Basilina Pereira

segunda-feira, 7 de julho de 2014

SONETO DA ESPERA


SONETO DA ESPERA
 

Voo no tempo que não vai nem volta

preso na tarde desses sonhos meus,

sei que a alvorada está para o poente

como os meus dias procurando os teus.
 

Se permaneço nesse céu sem cores

é pelos timbres que a memória guarda,

num vale longe onde mora o nunca

talvez  o sempre prepare a vanguarda.
 

Assim meus olhos colhem na janela

o canto aflito da ave ferida

pra transformar, quiçá, em aquarela.

 
E mesmo ali sob nuvens errantes

as horas dormem qual lua esquecida

e eu pesco estrelas qual fossem diamantes.
 

Basilina Pereira

sábado, 5 de julho de 2014

ANTIPOESIA

ANTIPOESIA

Haverá algo mais insípido
do que embalar a saudade num dia de sábado?
Só mesmo a cantoria
daqueles insistentes pardais
que desorienta a cavalgada do sono matinal,
e ignora as arestas do tempo.
Seu trinado é feito de quase luz
como um hino talhado na harmonia.
Eles alardeiam com júbilo sua cor marrom,
o mais monótono dos tons,
que nem figura no arco-íris!
Ah! esta antipoesia de hoje
até parece uma palavra afiada no escuro!

Basilina Pereira

quinta-feira, 3 de julho de 2014

TANGO


TANGO
 

O tempo segue

com o bailado submerso das ondas.

À tona, um vislumbre de tango

embalado pelo vai-e-vem do azul

que não tem a pressa, nem dúvidas.

Só mesmo o vento,

senhor da brisa e das tempestades,

semeia, como coisa fortuita,

a vibração do sentimento

que, quase sempre, desbanca

a previsão das palavras.
 

Basilina Pereira.

 

domingo, 29 de junho de 2014

ISSO


ISSO
 

Hoje o meu sentimento

segue....

à margem da palavra.

Impera uma sensação oclusa,

um repuxo além da razão

que destoa dos aromas festivos      

e do brilho incansável do dia.

Isso, que só o poema tritura,

tende a abafar os gritos

que o silêncio oculta

e perder-se

nos caminhos tecidos pela emoção.
 

Basilina Pereira

sábado, 28 de junho de 2014

VAGAMUNDO


VAGAMUNDO
 

Um rosto vago se alimenta

da multidão.

Anônimo,

segue seu ritmo,

como quem não tem pressa

de chegar.

Suas vontades confundem-se

entre um pedaço de conversa,

um perfume quase doce

um beijo atrapalhado.

No lodo da rua,

sua imperceptível presença derrapa,

apanha um olhar indiferente,

percebe o sorriso do mendigo,

seu gesto súplice,

aceita a mofa, dispensa o toque.

Em suas veias pulsam a noite e a solidão,

ele é só um vagamundo

que perdeu o porto

e a identidade,

mas não a lucidez,

esta sobrevive. em seu olhar.
 

Basilina Pereira

 

segunda-feira, 23 de junho de 2014

CAMUFLAGEM


CAMUFLAGEM
 

De tantos que fui, já me perdi.

Só um pária imunizado pelas erratas da vida

permanece nesse vulto chamuscado de mistério

que caminha a esmo, no ritmo da brisa.

Sem surpresa, foge do carbono de si mesmo,

aparando as arestas das palavras

que se escondem no vínculo do papel.

Silêncio branco!

É importante refazer o voo,

aprisionar o tempo de alegria...

Quem sabe um resíduo

de uma felicidade inusitada

vivida num outro tempo.

Volto ao espelho: mudo!

Nem sinal do espírito das chamas

que ousou desafiar as espadas lascivas,

a chicotear o tempo e o medo.

Quantos ainda serei?

Por minhas mãos líquidas escorre o enigma

de todas as vidas camufladas numa só.
 
Basilina Pereira

quinta-feira, 19 de junho de 2014

O ARCO-ÍRIS

O ARCO-ÍRIS.
 

Difícil tangenciar

essa volúpia secreta

escondida no brilho do olhar.

Nem as previsões mais ousadas

sustentam a imagem em negativo

dessa carne frágil

onde repousa a humanidade.

Há um sopro que flutua no cosmo

sujeito a impensáveis voos

e à textura do sentimento.

A alma viaja por onde a imaginação alcança

e a pele é o limite

que separa o orvalho das chamas.

No tempo certo,

o vento desenha o abraço

entre a luz e os pingos da chuva.
 

Basilina Pereira

terça-feira, 17 de junho de 2014

INQUIETAÇÕES II


INQUIETAÇÕES II
 

Olho a paisagem nova

com olhos da cor de ontem,

mas só vejo o ar inquieto

e o horizonte abstrato.

O mar grisalho navega as mesmas ondas

com a paciência dos galhos

que não têm data para florescer.

Instigada, pergunto-me:

onde buscar uma borboleta,

uma gota de orvalho,

com laivos inusitados?

Exploro arredores,

corredores sem portas,

janelas sem amplidão.

Leio livros de Sartre, Drummond e Clarice,

procurando o acervo de ternura

que possa durar além dos dias.

....

Terei que cultivar terras mais férteis

para limar  meus sentimentos?
 
Basilina Pereira

 

sexta-feira, 13 de junho de 2014

CAMINHADA


CAMINHADA 
 

Às vezes é preciso renascer

das cinzas que cobriram nossos sonhos

e fazer da caminhada - prazer -

 mesmo ao lampejo de um trovão medonho.
 

Em toda estrada sempre há tropeços.

Viver é gloria e também perdição,

o tempo é fluido desde o seu começo,

não vinga a flor que nasce da ilusão.
 

Que bom seria se todos os males

só fossem lendas de outra existência,

mas eles cantam em todos os lares

não conta a grei ou  sua descendência.
 

Nesta vereda sigo e mais não sei

nem há oráculo que possa explicar,

mas se tranco a vida nunca enxergarei

o quanto uma emoção pode brilhar.
 

Basilina Pereira

quarta-feira, 11 de junho de 2014

BRANCAS NUVENS


BRANCAS NUVENS
 

Esta noite passou em brancas nuvens:

nenhum vento na janela,

nem o cachorro latiu.

A festa do vizinho gorou,

o telefone não me trouxe aquela voz,

o galo...onde foi parar o galo?

No céu, silêncio de estrelas,

uma lua reticente

 e muitas respostas à deriva...

só achei filmes sem cor na tv

e perguntas sem coragem de nascer
 

Basilina Pereira

 

sexta-feira, 6 de junho de 2014

OUSADIA


OUSADIA
 

Às vezes me invento poeta.

Ousadia de quem não tem medo

de turvar as primaveras.

Cometo excessos,

me rendo ao cansaço e sofro...

Vez ou outra um gesto insano

desafia aquela chuva teimosa

que molha meus pensamentos

e eu me afogo em lembranças

aprisionadas no triunfo

de uns poucos versos

insossos como a fria água partida.

Tento lustrar os vocábulos

mas o brilho está além de algumas rimas.

Só então percebo que para o poema florir,

há que se adubar as palavras. 

Basilina Pereira

 

quinta-feira, 5 de junho de 2014

APELO


APELO 

Lua cheia em plena nave,

mãe do espaço estelar,

eterniza esses meus versos

como faz com a onda do mar!

Irriga o meu sentimento:

este elã que não tem par,

nas ondas do pensamento

e em teu brilho quero estar,

flutuando sobre  as rimas

ao encontro do verbo amar.

Na lâmina que corta a dor

na verdade a se buscar

no antídoto do engano

com paixão quero ficar.

Tanta pergunta latente

e resposta sem lugar,

mas o tempo do poema

esse não pode acabar! 

Basilina Pereira

segunda-feira, 2 de junho de 2014

CISMAS


CISMAS
 

Sou filha da primavera,

quero a chuva pra florir

tenho tanto pra dizer,

não dá mais pra só sentir.

 

Mas o que sinto e não nego,

só vai caber num poema,

no recinto das palavras

que bordam rimas serenas.

 

Vou falar do voo nascente,

que rasga o medo no escuro

dos sonhos vivos, recentes,

que um dia serão maduros.

 

E entre as outras estações,

quando eu tiver que fugir

do calor ou neve opaca,

mesmo assim vou transgredir

 

a orla do pensamento,

riscar o fundo do abismo,

voltar a qualquer momento

com tudo aquilo que cismo.
 

Basilina Pereira