quinta-feira, 30 de abril de 2015

PERCEPÇÃO

Do lado de dentro o mesmo rebuliço
que o sentimento não tem avesso nem forma.
O exterior é campo pisado:
é onde a brasa dança sozinha sobre o feno
e desenha os arabescos
que a vida vai deixando à margem dos dias.
Ao poeta cabe assistir a tudo
de sua janela solitária
e transformar em versos, sem machucar
os sonhos congelados nas artérias da alma.

Basilina Pereira


quarta-feira, 29 de abril de 2015

UM NOVO POEMA

Quando penso que tudo já foi dito,
tenho vontade de parar as estações,
mas logo alguma coisa canta no fundo da alma
e acorda os sons que dormem nos beirais.
Enquanto isso, figuras inéditas se mostram
para emoldurar o silêncio que descansa.
Num lapso de segundo,
o mundo real não está mais aqui.
Mesmo sem entender os sinais,
deixo-me levar pelo giro da roda:
quem sabe na outra volta
um novo poema se desprenda sua luz.


Basilina Pereira

quarta-feira, 22 de abril de 2015

DIVAGAÇÕES
I
A poesia é como o relâmpago:
fulminante, única, imediata.
Se o vento sopra mais forte,
lá se vai ela, com ares de nunca mais.
II
O amor também é arisco,
exigente. Chega a doer sem dor
e retorna poucas vezes
como um cometa que já passou.
III
A confiança, mais que tudo,
é a pedra que se equilibra no fio da seda,
se cair é como se o elo evaporasse
por não ter mais onde pousar.
Basilina Pereira

terça-feira, 21 de abril de 2015

BRASÍLIA

Uma cidade que canta,
que chora, trabalha e paga o preço
de ser detentora da chave e da mão.
Bela em sua silhueta de voo,
congrega os sotaques que ressoam de norte a sul do país
e sintetiza as cores da África, do Velho Continente,
que, miscigenadas, desfilam sob o sol do Planalto.
Por suas longas avenidas transitam carros e sonhos:
os daqueles que vieram em busca de novos campos
e os de quem viu, ao nascer,
este céu detentor de um azul singular.
De seus palácios emana o poder
e à sua volta palpitam as emoções e os anseios
de todos que acreditam, que querem mais.
Mais dias promissores
cuja essência tenha por raiz e polpa
os acordes da verdade e da ética.


Basilina Pereira

domingo, 19 de abril de 2015

BRASÍLIA, MINHA CASA

Uma homenagem pelos 50 anos da Capital

Foi difícil amar Brasília, confesso.
Seu jeito de princesa pós-moderna,
tão longe da minha pequena cidade!
suas retas sisudas,
embebidas em cimento queimado,
como se quisessem petrificar o horizonte.
Algumas curvas...sim,
mas de aparência tão gélida,
que eu conseguia sentir seu frio na retina.
Mas pouco a pouco, suas facetas foram se mostrando,
e eu fui me encaixando na textura do cerrado,
e sendo tomada por um céu tão azul
que custava a caber na palavra.
E os ipês então? de fazer inveja aos girassóis.
Foi aí que me rendi
e hoje, Brasília é a minha casa!

Basilina Pereira

sexta-feira, 17 de abril de 2015

CONTEXTO

Estranha sensação:
a palavra não vem, o verso não brota,
o amor é um pensamento solitário.
Nem era para germinar,
registra o lado árido do poema.
A vida é um emaranhado de rabiscos
e nem sempre traça o formato da rosa.
Só que a poesia também é feita de talvez
e, nessa rota, não há como trancar o coração
dentro de uma fotografia.

Basilina Pereira

segunda-feira, 13 de abril de 2015

5º e último dia da corrente poética proposta por Jane Simão. Indico Hoje Soninha Porto para dar seguimento, conforme critério pré-estabelecido.

CANÇÃO

A música debulha alegria
como um rosário de fé
e as cores, em nuances crescentes,
vão embalando nota por nota,
antes que alguma ave, desavisada,
apanhe os sons para lhe adornar o canto.
Minha essência, feita de sonhos e esperança,
segue entoando seu canto azul,
levemente colorido de dourado
e a canção que resulta desse instante
faz o sol perder a hora de dormir.

Basilina Pereira

domingo, 12 de abril de 2015

REDEMOINHO

Um vento rebelde sopra palavras de todas as cores,
descasca os acordes no viés da tarde
e respinga respostas sem berço e sem eco,
neste descampado onde as perguntas
ainda esperam para nascer.
Quero canalizar esses sons na retina,
emoldurá-los na raiz do sentimento
e depois (quem sabe)
replantá-los num viveiro de poesia.
E quando o sol me chamar mais uma vez à janela,
talvez eu possa acreditar nessa luz que me aquece,
nos pingos que desenham o arco-íris
e entender o sentido de tantas coisas
que ainda vagam à procura do ninho.

Basilina Pereira


O RESGATE

Ainda me ardem esses passos vampiros
que balançam o solo das palavras.
No meio das pedras, por entre a poeira,
o som que cai é amarelo
e por isso o crepitar das folhas.
As árvores nuas esperam a chegada das respostas
que estão perdidas em alguma estação passada.
Sim, é outono.
A primavera foi sequestrada pelo vento de agosto
que exige, por resgate, verdes tardes de poesia.

Basilina Pereira

quinta-feira, 9 de abril de 2015

ASSIM É...

Na ponta da chama, o perigo.
Aquele frisson que é medo e é êxtase
e, se mais não fosse, ainda seria
o brilho que se sobrepõe ao reinado da razão.
Assim é o amor:
flameja, reverbera, consome
e no encanto que balança as tardes,
descarta a certeza e escala a emoção.


Basilina Pereira

terça-feira, 7 de abril de 2015

POEMA MATINAL

Assim: do nada,
o silêncio vai assoprando
as imagens que brotam da lembrança.
O pensamento corre tão célere que, a custo,
as palavras encontram a roupagem que vestem.
No compasso das horas, a manhã sonolenta
vai descobrindo cores risonhas,
cuidando para que tons acres
não se sobreponham à curva do sorriso.
A película entre um minuto e outro é a medida certa:
ao olhar duas vezes para o mesmo ponto,
a luz se mostra com mais clareza.


Basilina Pereira