OUTONO NO PARQUE
Meu outono confunde-se com o parque.
Sentimentos pisam o tapete dourado,
aquele chão bordado de folhas,
que, no porta-passos da emoção,
tenta descobrir por que há tantos lugares vazios.
As árvores só observam...
E meus pensamentos voam atrás das palavras
ou traços de lembranças
de uma paixão que viu tremerem aqueles bancos
que hoje repousam sob um amarelo-esquecido,
que nem parece descendente do sol.
E a quietude do ar se mescla a minhas lembranças.
Inverto o olhar...
Tento descobrir sob a minha pele
uma última flor derramada do verão,
uma única flor...
que possa exalar algum perfume
capaz de fazer do silêncio uma canção.
Basilina Pereira
sexta-feira, 27 de junho de 2008
domingo, 22 de junho de 2008
DEIXA
DEIXA
Deixa a noite te abraçar por inteiro
e te adornar os olhos de sonhos,
para o cansaço te deixar ligeiro,
e o amanhecer não te encontrar tristonho.
Deixa o sono transpassar teu leito,
a madrugada te cobrir de orvalho,
o vento brando te afagar o peito
e levar a dor num lenço de retalho.
Deixa as estrelas dormirem no azul
até que a lua lhes cubra de prata
os vaga-lumes mostrarão o sul
para as cigarras, hoje, em serenata.
Deixa o silêncio te mostrar as notas
que a nebulosa entoa num clarão,
só um poeta cata as letras tortas
se o amor voou atrás de uma canção.
Deixa a fumaça desenhar anéis
no labirinto do teu coração
que hoje passa, amanhã também
e o sol retorna, com ele o verão.
Basilina Pereira
TRANSCENDÊNCIA
TRANSCENDÊNCIA
Senti minhas asas queimando em seu olhar.
Aquele fogo derretia minhas sebes
e uma luz me ofuscava como flecha envenenada,
tingindo a água que passou a verter de meus olhos.
Os sons circundantes ecoavam como banalidades
e as cores mais pareciam figuras bizarras
exalando aromas, numa apoteose litúrgica.
E eu, atingida por narcóticos olhares,
senti-me, de repente, envolvida em sedas
tomada, ora de estranho sensualismo,
ora de desejos espiritualizados,
como num sonho macerado de glória,
sedento do enigma daquele êxtase.
Perdi o tempo e a lucidez.
Só vi uma orquestra moendo meus sentimentos
e um vulcão a fremir em meu peito,
volvendo espasmos a voejar em volúpia e brasas.
Esfinge, desencanta-me,
antes que a tarde enlouqueça de vez
e eu comece a dançar sem os pés.
Basilina Pereira
segunda-feira, 9 de junho de 2008
PASTORA
PASTORA
Sou pastora da poesia
cavalgo versos de anis
se rimo a noite com o dia
não sei bem por que o fiz.
Mas não consigo outras plagas
outro jeito de rimar
se solto a letra e as mágoas
esse é meu jeito de amar.
E assim caminho entre as linhas
do poema inacabado
catando dores tão minhas
vislumbrando o outro lado
onde o soneto não dorme
sobre um poema concreto
e a práxis vige conforme
seu próprio corpo e contexto.
Sou pastora da poesia
sob a chuva ou Sob o sol
e as palavras, quem diria!
São a isca em meu anzol.
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