sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

O VOO DA BORBOLETA



O VOO DA BORBOLETA

a voz soluça amputando o meigo da face.
A língua camuflada e trêmula
é testemunha silenciosa:
como no retrato em preto e branco
escondido no espelho da vida.
O verbo pede um poema mudo,
daqueles que revelam o frio na medula,
quando a palavra é despetalada
para dar vazão ao medo de sentir.
Depois, o destino... atrás de janelas abstratas,
como a sacudir as almas que dormem
e também as outras
que, despertas, anseiam pelo momento
de voar com as borboletas.

Basilina Pereira

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

DEPOIS DA TEMPESTADE



DEPOIS DA TEMPESTADE

O dia acorda sereno sobre o coqueiro.
Nenhuma folha assustada
com a tempestade de ontem.
Parece até que nunca mais – o temporal:
selvagem, impiedoso,
rente ao hemisfério do medo
abafado no absurdo da noite.
É que hoje o sol abriu as janelas,
abrandou a fúria de Zeus
e salpicou ondas de alegria sobre a manhã.
A carne ainda tremula, vacilante
pelos hiatos que permeiam a respiração,
mas a luz tem seus mistérios,
a despeito dos caminhos sem volta,
ela faz o riso se desprender da nuvem e raiar.

Basilina Pereira

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

A VIDA



 
A VIDA

A vida. Um grito perplexo,
quase feliz,
no escuro frio de um corredor.
É mais que um coração pulsando,
mais que um corpo,
que um sobressalto,
um desejo adormecido,
mas insubmisso.
Pode até ser fluida
e dissolver-se em estranho cortejo,
mas é no gume de uma lâmina
que ela brota líquida, veloz,
vibra em tortuosos labirintos,
e se reinventa,
desafiando o mistério.

Basilina Pereira

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

A OUTRA ASA


A OUTRA ASA

De um ninho sem poente
toda a incerteza grita
sobre os tons que transbordam ao amanhecer.
Para a asa que parte
o retorno nem sempre é certo,
mas aquela que volta e pousa
pode dormir sobre a noite inteira.
Aquela... que não era garantia nem promessa,
só esperança.

Basilina Pereira

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

AS ESCOLHAS



AS ESCOLHAS
I
Há uma noite inteira para chorar
sobre a lágrima derretida
e um dia somente
para ver que a mágoa
é palavra perdida
num labirinto sem cores.
II
A descortesia arranha o sorriso,
escala a parede,
alimenta a fúria
e revela
o avesso da poesia
oculto à sombra da palavra.
III
Se o passo avança melhor rente à luz,
que seja de brilho
o olhar, o gesto
e as aparas do cotidiano
que fazem valer a pena
as escolhas...
Sim, as escolhas.

Basilina Pereira