ATRAÇÃO
Cheiro de mistério
impregna minha narinas ensolaradas.
Há uma ameaça de nuvem cobrindo meu rosto
e o ar quente magnetiza meus olhos e minha mente.
Um arrepio me percorre o corpo
e as pernas trêmulas atropelam o passo
encolhido em sua insegurança momentânea.
Sua presença abre uma cratera
de medo, prazer e paixão
que escorrem pelos poros
até o limite da lucidez.
Com as mãos molhadas descubro
que gente renasce, às vezes.
Basilina Pereira
terça-feira, 27 de maio de 2008
segunda-feira, 26 de maio de 2008
SEM PREÇO
SEM PREÇO
...um bom filme na tv
um horizonte pra se ver
uma xícara de café
chinelo velho no pé
o abraço de um amigo
chuva fina e um abrigo
olhar o filho dormindo
ver o amor chegar sorrindo
andar descalço na grama
lençóis macios na cama
um sorvete de avelã
a brisa fresca da manhã
uma rede na varanda
boa roda de ciranda
beija-flor frente à janela
e um jantar à luz de velas...
Basilina Pereira
O JARDIM
O JARDIM
A gente passa pela vida
ora amando ora sofrendo por um amor.
Uma vez me perguntaram o quanto eu era feliz amando
e como enfrentava os delírios da dor.
Respondi que meu jardim era sempre verde,
mas muitas vezes não tinha flores.
Há quem saiba apreciar o verde
e também os que não vivem sem as flores.
Eu admiro todas as flores
mas aprendi a amar a orquídea.
Ela floresce apenas uma vez ao ano.
Sua flor é exuberante
e seu perfume...ah o seu perfume!
Sua floração dura mais tempo que outras
talvez para compensar a longa espera.
Basilina Pereira
PALAVRA (QUE)BRADA
Ás vezes é quase nada
só uma noção de sentido,
um sentimento doído
de uma frase mal falada
envolta e jogada ao vento
folhas de verdes dormentes
que com o vigor da semente
dilacerara o sentimento.
Relâmpago na madrugada
risca o olhar e queima a pele
palavra (que)brada fere
se não for dimensionada,
age qual vela partida
com luz própria, feito brasa,
queima o sonho e dobra a asa,
devora com letra a vida.
Basilina Pereira
TARDE DE DOMINGO
TARDE DE DOMINGO
A tarde na varanda desafia a minha imaginação.
A rede silenciosa e cansada recusa-se a colaborar,
esticada em seus punhos de algodão doce.
Os pássaros do jardim, em tarde de gala,
executam seu pequeno concerto vesperal
sob a regência de um colorido bem-te-vi,
a percussão do “fogo-apagou”e
o coral de inúmeros pardais.
Borboletas amarelas desenham círculos entre as orquídeas,
pousando aqui e ali em sua jornada simples e óbvia.
O vento parece ter se escondido nas cavernas
tamanha a quietude das folhas...
E eu me sinto parte desse mundo
e pergunto a meus pensamentos
como semear este momento de paz?
Basilina Pereira
sexta-feira, 9 de maio de 2008
AS HORAS
AS HORAS
Escuto a linguagem da noite
como se buscasse no tempo
os sonhos incandescentes
que desafiam o tic-tac do relógio.
Além do orvalho esquivo
que se recusa a regar meus pensamentos
despontam lembranças comuns
tão mutáveis, mas assim mesmo tão iguais.
Na penumbra das horas
vagas formas deságuam
de meus olhos sem estrelas
e seguem o rastro das gaivotas.
Procuro a voz no silêncio:presa,
ensaio um canto obscuro
pra que a brisa retorne com seu eco,
mas o som que volta é oco, é pouco.
Basilina Pereira
O EIXO
O EIXO
Neste mundo aportamos
sem mares, sem caravelas,
nada diz porque chegamos
a este beco de vielas.
E o caminho aí começa
sem manual de instrução
tudo é longe, haja pressa,
correm os pés e as mãos.
Numa aventura tão ampla
o corpo reclama a rede
e a alma, às vezes, descampa
solitária em sua sede.
Uns chegando outros partindo
sem saber como e por quê
e os degraus vamos subindo
pra onde não sei dizer.
E o segredo assim persiste
além do tempo e da hora
há quem nos campos insiste
e os que partem sem demora.
Cogitam tantos desfechos
dessa viagem sem par
só não decifram o eixo
que faz a roda girar.
Basilina Pereira
CAMUFLAGEM
CAMUFLAGEM
Não sei se a dor chegou com a tarde
ou com o vento
que balançou as cortinas do tempo
e fez voar a poeira que parecia dormente,
camuflada entre os lapsos de silêncio.
Ou talvez ela tenha voltado pra espantar o limbo
que vivia a escoltar meus pensamentos
perdidos entre o resto de memória.
O tempo é traiçoeiro.
Se por um lado ele eterniza momentos
desafiando o muro dos séculos,
há o perigo incrustado nos enredos efêmeros
quando o corpo e o espírito submissos
descuidam da tessitura do veio,
fazendo com que a música se apague.
São fios de uma mesma meada
que tecem o começo e o fim,
em descompasso,
quando a alma não resiste
e sons emaranhados sopram o fogo
que torna o horizonte encharcado e escuro
como uma explosão nuclear.
Sentimentos perdidos, anseios quebrados,
por que regressam? Estavam tão bem guardados!
Basilina Pereira
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